Num cenário de pandemia que visibiliza, a cada dia, a crescente política econômica voltada apenas para alavancar interesses mercantis acima da defesa do direito à vida de todos os que são alijados da distribuição da riqueza coletivamente produzida, os ataques ao direito à educação e à pesquisa multiplicam-se. Dentre eles, aprofundam-se os que se voltam às ciências que não são vinculadas apenas a atividades fins e não geram produtos com interesses mercantis. Verifica-se, nesse processo, diversos ataques às Ciências Humanas e Sociais, reduzindo-as à condição de tecnologias que valorizam a abordagem puramente instrumental de complexos temas que compõem os estudos sócio-humanos, constituindo-se como forma de saber estratégico para a política de sucateamento da educação pública, laica e de qualidade. 

São visíveis as artimanhas da Portaria CAPES nº 55, de 29/04/2020, que prorroga por mais três meses as bolsas Demanda Social em curso, durante a pandemia, sem garantir a concessão de novas cotas enquanto essas estiverem em vigência. Consideramos fundamental a proteção dos estudantes durante essa pandemia e, nesse aspecto, é necessária a prorrogação. Por outro lado, a portaria desconsidera as dinâmicas dos diferentes Programas de Pós-Graduação – PGs com relação ao ingresso de novas/os alunas/os que só podem desenvolver suas pesquisas com o suporte financeiro das bolsas. Uma prorrogação de caráter emergencial, somada à ausência de novas cotas, inviabiliza o necessário ingresso de novos discentes nas vagas ofertadas pelos PPGs.  Ademais, a prorrogação por mais três meses pode gerar ociosidade de bolsas em programas que não têm demandas reprimidas por bolsistas. Observa-se que sem estas demandas, teremos cotas que se encerrarão antes do término do ano letivo, cuja previsão neste período de pandemia foge aos planejamentos administrativos dos programas.  Muitas/os estudantes, sem a bolsa, sequer iniciam seu ingresso nos PPGs.

A concessão de recurso por mais três meses tem repercussão imediata nas necessidades financeiras de discentes afetadas/os pelos efeitos da pandemia, mas tem também efeitos sobre os não bolsistas que estão à espera do recurso para iniciarem ingressos nos PPGs ou para terem possibilidade de continuar com as suas pesquisas. Não se trata, apenas, de uma prorrogação de bolsas, mas de uma condução política que se faz à revelia das necessidades efetivas de manutenção de condições das/os  pesquisadoras/es. 

Com vistas à  implementação gradual do novo modelo de gerenciamento de bolsas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), enquanto os PPGs se organizavam no gerenciamento dos efeitos da Portaria da CAPES, foram surpreendidos com a suspensão das indicações de bolsas no modelo de cotas em PPGs a partir de 01/07/2020 e com a definição de que as bolsas de mestrado e doutorado no país em curso, serão mantidas, até o final de suas vigências, nas cotas dos respectivos PPGs.

O novo modelo de concessão de bolsas que vem sendo anunciado pelo CNPq se constitui em uma ação construída de forma antidemocrática, sem ouvir e considerar a realidade dos Programas de Pós-graduação. Tal modelo retira autonomia dos Programas, uma vez que não possibilita a estes definir os critérios de acesso às bolsas, conforme a realidade local e necessidades específicas de cada PPG. Além disso, pelo novo sistema que está sendo divulgado pelo CNPq, a maior parte das bolsas passará a ser distribuída por meio de editais cuja lógica não considera a necessidade e realidade de todas as áreas do conhecimento e tendem a tornar obscuros os processos de definição de escolhas de bolsas no Brasil. 

Diante desse cenário, a ABEPSS soma-se às manifestações das demais Associações acadêmico-científicas e da Associação Nacional de Pós-Graduandos – ANPG, denunciando os efeitos da Portaria nº 055/2020 – CAPES, bem como a suspensão de bolsas anunciada pelo CNPq. 

Brasília (DF), 02 de junho de 2020.

Gestão “Resistir e avançar, na ousadia de lutar!”