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Apesar dos avanços no combate à epidemia de HIV, Brasil vive retrocesso ligado ao conservadorismo

1/12/22 às 00:00
Os avanços no combate à epidemia de HIV foram muitos nos últimos anos, entretanto a transmissão do vírus ainda é um problema de saúde pública. Por isso, o 1 de dezembro, Dia Mundial de Luta contra a AIDS, é um momento importante para levar informação a toda a sociedade, combatendo também o preconceito e estigma em torno do assunto, sem prejuízo de um trabalho permanente de educação em saúde.

De acordo com Ana Cristina de Souza Vieira, professora titular do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), é importante que haja uma data para reflexão sobre a Aids, o vírus HIV, a prevenção e a relação da sociedade com isso. Apesar de ainda ser um problema de saúde pública, o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) vem construindo um consenso internacional para enfrentamento da epidemia de HIV, considerando a possibilidade de seu fim até 2030.

“Houve na década de 2010 uma grande mudança no enfrentamento à epidemia, indicando o uso de antirretrovirais a partir do momento de identificação da infecção. Antes disso, somente quando as defesas do organismo já estavam muito baixas era indicado o uso de antirretrovirais. Com o novo protocolo, as pessoas ficam com o vírus indetectável e não transmitem. Essa condição é extremamente importante enquanto não se obtém uma vacina. Há também a possibilidade de acesso à profilaxia pós-exposição (PEP) e pré-exposição (PrEP), que protege pessoas que sofrem acidentes com objetos perfurocortantes, sofrem violência sexual, ou convivem como casais sorodiscordantes. É importante que a sociedade esteja informada sobre as formas de prevenção e tratamento, especialmente as populações-chave que são homens que fazem sexo com homens, pessoas trans e travestis, e trabalhadores do sexo”, explicou.

Conservadorismo

Ana Cristina de Souza Vieira, que também é coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Políticas Sociais e Direitos Sociais (NEPPS) da UFPE, destaca que as formas de infecção pelo HIV, desde o início da epidemia no mundo, estão relacionadas principalmente a práticas sexuais que fogem aos padrões tradicionais, ou à utilização de seringas compartilhadas entre usuários de drogas. Com isso, o estigma em relação às pessoas vivendo com HIV e Aids foi construído com suporte no conservadorismo que vem crescendo globalmente, articulado ao fortalecimento do neoliberalismo.

“É preciso enfrentar o conservadorismo, reduzindo as desigualdades, respeitando os direitos sexuais e reprodutivos, investindo nos direitos humanos e no direito à diversidade. A defesa da família tradicional, o fim dos serviços de proteção social, exigindo das mulheres a responsabilidade na reprodução social, ao mesmo tempo em que ocorrem reformas trabalhista e previdenciária que cortam direitos e garantias sociais, serve aos interesses conservadores e, ao mesmo tempo, aos programas de austeridade fiscal”, disse, lembrando que o governo de extrema-direita agiu pesadamente a favor de interesses privatistas na área de saúde, conseguindo desfinanciar o Sistema Único de Saúde (SUS).

“O SUS, já fragilizado com o subfinanciamento desde sua criação, sofreu ainda o desmonte e retrocesso em inúmeras áreas e programas, desde a saúde mental, saúde das mulheres, saúde da população negra, entre outras. Em relação ao enfrentamento do HIV, o Ministério da Saúde invisibilizou o HIV, ao transformar o Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais no Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis.  O Ministério também silenciou as iniciativas e campanhas de informação em saúde voltadas para pessoas com infecções sexualmente transmissíveis e HIV. Proibiu a discussão de questões relacionadas a direitos sexuais e reprodutivos em escolas. O golpe final foi o corte no programa de HIV/AIDS para 2023, no orçamento proposto”, assinalou.

A professora também lembrou que, apesar da redução do HIV e Aids em diversos países no mundo com os novos protocolos para prevenção e tratamento, no Brasil a redução só começou após 2019, mantendo trajetória de aumento entre jovens gays e uma prevalência entre as populações-chave estabilizada em patamares altos.

Serviço Social

O fortalecimento da extrema-direita no Brasil e sua chegada ao poder, por meio do bolsonarismo, permitiram retrocessos em diversas áreas como o acesso aos meios de prevenção, aos tratamentos para quem vive com o vírus HIV e à informação. Será preciso reverter os danos das políticas dos últimos anos e as/os assistentes sociais têm um papel importante nesse processo.

“É preciso reverter o desfinanciamento do SUS, recompor o orçamento para HIV/Aids, fortalecer os processos de educação em saúde, voltados para a população em geral e, principalmente para as populações-chave. É necessário que o Governo Federal se paute pela cientificidade, sem permitir que o conservadorismo domine as diretrizes para as ações de saúde”, defendeu.

A professora Ana Cristina de Souza Vieira salienta, ainda, que assistentes sociais participam de serviços para pessoas com HIV/Aids e lutam em espaços de defesa do SUS, como a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde. Por isso, ela conclui ressaltando que as/os profissionais precisam “defender o SUS, se apropriar de conhecimentos para avançar nessa defesa, se articular com os sujeitos sociais que estão nessa luta, e acompanhar as diretrizes internacionais sobre o HIV”.

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