O capitalismo está criando mecanismos mais sofisticados de desvinculação dos custos de sua produção e levando isso ao limite. É o que explica Regina Ávila, secretária-geral do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) e professora do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
“Estou chegando de um encontro internacional em Dijon, na França, em que nos reunimos com trabalhadoras/es e entidades de vários países. O avanço do capital sobre o fundo público, o ataque aos direitos sociais, e a redução da cobertura do estado para políticas fundamentais é global. Há diferenças de acordo com a história de cada país, mas são as mesmas estratégias: desemprego, contratação sem salário garantido, entre outras. Na Europa esses ataques são mais direcionados a imigrantes. O que o capitalismo puder fazer para se desprender dos custos, ele vai fazer. Por isso o trabalho é atacado ao mesmo tempo em que se avança sobre o fundo público como forma de rentabilizar o capital e manter as taxas de lucro extrapoladas”, disse a professora.
Eleições
Regina Ávila lembra que, em ano eleitoral, é preciso que a classe trabalhadora esteja atenta ao compromisso histórico das candidaturas colocadas com a defesa dos direitos sociais. “E mais do que isso, temos que pressionar para que candidaturas que dizem defender a classe trabalhadora se comprometam em voltar atrás nas reformas que prejudicaram a classe trabalhadora. Precisamos fazer com que todas essas medidas sejam revogadas. Do ponto de vista do Andes-SN, a disputa esse ano é especial porque precisamos derrotar Bolsonaro nas urnas e, principalmente, nas ruas. Se não estivermos nas ruas para derrubar agora, corremos o risco de nem termos eleições”, alertou.
A dirigente sindical ressalta que o foco não pode estar apenas nos cargos do executivo, frisando que o Congresso será muito importante. Para ela, “a escolha de deputados e senadores será fundamental. Não será possível mudar as coisas com uma grande bancada de extrema-direita pentecostal. Por isso digo que para nós estarmos na rua é fundamental. Não dá para apostar no desgaste desse governo sem colocar as entidades em luta. Talvez o maior desafio venha depois da eleição. Essa apologia institucional para nós traz problemas”, disse.
Serviço Público
No serviço público federal, que inclui grande parte dos docentes do ensino superior, as perdas salariais, apenas no Governo Bolsonaro, já somam 19,99% diante de uma inflação descontrolada e um ambiente que precariza a vida das pessoas. O índice, que é reivindicado como recomposição salarial das/os servidoras/es, não representa aumento, mas apenas uma reposição de parte das perdas acumuladas ao longo de anos.
“Há diferenças entre as categorias no serviço público federal. Esse é um número linear (19,99%) em que chegamos para que conseguíssemos fazer a luta de forma unitária. Desde janeiro de 2022 protocolamos pedido de negociação com o Governo Federal e até agora isso não aconteceu. E estamos fazendo a defesa dos serviços públicos para além dos salários. A perda do poder de compra tem impacto nas condições de vida. Há uma inflação de alimentos muito alta. Os preços dos combustíveis não param de subir. A consequência desse processo chega antes no serviço público que vai perdendo capacidade e qualidade. Por isso temos que revogar o Teto de Gastos (Emenda 95), que congelou os investimentos em Educação e Saúde por 20 anos, e lutar contra a PEC 32 (Reforma Administrativa), que vai desfigurar os serviços prestados à população. Conseguimos parar a PEC 32 em 2021, mas ela ainda está lá e precisamos retirar da pauta definitivamente”, disse Regina.
O Governo Bolsonaro ampliou ainda mais o desfinanciamento dos serviços ao cortar 15% dos recursos da Educação, aprofundando a precarização, com falta de verbas para pesquisa e extensão, comprometimento da qualidade de trabalho, além da impossibilidade de muitas/os estudantes permanecerem nas universidades com cortes de bolsas e valores insuficientes.
“E a Covid-19 trouxe outros desafios. A única alternativa foi o ensino remoto sem preparação e sem insumos necessários, impactando professoras/es, técnicas/os e estudantes. Chegamos em um nível de falta de limite entre a vida e o trabalho. Além disso, há todo o desgaste negacionista da ciência promovido pelo bolsonarismo e a luta para que tivéssemos vacina e para que a população aderisse ao imunizante. Tudo isso precariza ainda mais e traz um desgaste mental que estamos identificando melhor com o retorno presencial. A possibilidade de uma permanência do remoto como parte do ensino é outro contexto contra o qual teremos que lutar. O nosso projeto antagoniza com esse projeto à distância. Somente com unidade com todos os setores poderemos fazer frente a isso”, explicou.
Serviço Social
Tanto o exercício quanto a formação em Serviço Social são impactados pelo cenário de precarização do trabalho e ataque aos serviços públicos em curso no Brasil. E isso implica também um ataque ao projeto ético-político do Serviço Social. “Por isso temos que fortalecer o nosso projeto ético-político. Hoje há grande quantidade de chefias e gestões lideradas por evangélicas/os usando o cargo para impedir o avanço de pautas anticapitalistas, LGBTQIA+, feministas. Isso se dá por meio de contratações temporárias, em detrimento de profissionais de carreira que arriscaram as próprias vidas nos momentos mais terríveis da pandemia”, disse Regina Ávila.
A professora defende que o Serviço Social não pode se isolar, estando pronto para contribuir no enfrentamento às causas da pobreza, mesmo diante de limites institucionais e trabalhistas. “Temos que entender que lutar pelos direitos sociais é fundamental, primeiro porque é uma questão de defesa da vida da população, e segundo porque quando a população tem suas necessidades atendidas, ela consegue lutar mais e se organizar mais. E nisso há uma Importância política porque quando você tem uma sociedade mais plena de direitos, há mais condições de luta. Retirar direitos é também uma forma de minar a possibilidade de mobilização da população. Por isso, precisamos lutar em conjunto com outras categorias. Nossas entidades do Serviço Social são fortes e têm uma direção correta. Precisamos estar unidas/os nos locais de trabalho com as entidades sindicais para avançarmos”, convocou.
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