É o que defende Dandara Felícia, militante transfeminista interseccional, e travesti preta bissexual. Ela estuda as relações da transvestigeneridade, trabalha na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e é cofundadora do CeR-LGBTQIA, além de coordenadora da ASTRA-JF.
Para ela, o Serviço Social tem sido expoente na articulação com movimentos sociais, e na construção do conhecimento para a construção de políticas públicas. Ela ressalta que essa característica ajuda as pessoas trans a pensarem as possibilidades de acessar o campo acadêmico sem sofrimento e cerceamento das pautas.
“Ainda precisamos avançar muito, mas nossa pesquisa, por exemplo, busca trazer respostas às demandas da comunidade trans, evitando pensar somente que precisamos criar vagas de emprego. Precisamos sim criar vagas, mas precisamos também aumentar a escolaridade para que essas pessoas alcancem outras vagas. Precisamos garantir a segurança para a transição de pessoas trans porque é uma violência precisar esperar anos para fazer a transição por conta da insegurança econômica”, explicou.
Visibilizar e pautar a transexualidade
Para Júlio Mota de Oliveira, mestrando no Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e pós-graduado em Relações de Gênero e Sexualidades pela Faculdade de Educação da UFJF, o Dia da Visibilidade Trans é uma oportunidade para que pessoas trans e travestis possam pautar temas que as atravessam enquanto sujeitos como a invisibilidade de suas existências e a marginalização de seus corpos.
“É uma data em que reivindicamos o acesso aos direitos humanos básicos como o direito à vida, à saúde, à educação e ao trabalho, que são garantidos a todas/os pela Constituição Federal, mas que, na prática, nos é negado pela transfobia estrutural e, principalmente, pela omissão do Estado”, disse.
Júlio Mota explica que o debate acerca das transexualidades é fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade menos transfóbica. “Especialmente na academia, a ampliação da discussão acerca do tema proporciona o desenvolvimento de estudos mais aprofundados sobre a questão, levanta o questionamento sobre a ausência dos nossos corpos nas universidades e possibilita também a formação de profissionais qualificados nas mais diversas áreas do conhecimento, para atenderem à população trans sem reproduzirem a transfobia estrutural”, considerou Júlio, que também é advogado voluntário do Centro de Referência LGBTQIA+; membro do GEDIS/CNPq – Grupo de Estudos e Pesquisas em Sexualidade, Gênero, Diversidade e Saúde: Políticas e Direitos da Faculdade de Serviço Social da UFJF; e Secretário da Comissão Estadual de Diversidade Sexual e de Gênero da OAB/MG.
Transexualidade não é doença
A partir de 2022, os 194 países que integram a Organização Mundial da Saúde (OMS) não poderão mais classificar a transexualidade como doença e terão que modificar a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID). A decisão foi tomada em 2018 e o prazo dado, 1º de janeiro de 2022, foi definido para que houvesse tempo de adotar a nova edição da CID.
Dandara Felícia chama a atenção para o fato de que, mesmo com a modificação da CID a respeito da questão da transvestigeneridade, que não será considerada doença, a sociedade ainda enquadra as pessoas trans como doentes que não sabem sequer ter auto-agência.
“Existe uma prática constante na sociedade em produzir processos para as pessoas trans sem que nós sejamos inseridas nesse processo. A propositiva já chega pronta e a partir daí a gente aceita se quiser. Isso demonstra o quanto ainda precisamos avançar na visão que as pessoas têm sobre as pessoas trans no dia a dia”, disse Dandara.
Júlio Mota de Oliveira explica que, apesar do Brasil seguir como o país onde há mais assassinatos de pessoas trans e travestis em decorrência da identidade de gênero no mundo, não há estatísticas com dados oficiais acerca da população trans.
“Isso inviabiliza a criação e implementação de políticas públicas voltadas para essa população e com o objetivo de suprir tamanha desigualdade. Neste sentido, as temáticas acerca das identidades dissidentes devem ser abordadas desde os cursos de ciências sociais aplicadas até os de ciências da saúde”, concluiu Júlio.
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