A forma enganosa com que o Governo argumenta quanto à necessidade da contrarreforma, apoiado no discurso do déficit orçamentário, é mesmo uma farsa. Como já ficou demonstrado por diversos especialistas, a previdência é superavitária.
O que está por trás dessa proposta? Na verdade, ela visa atender aos interesses do capital financeiro, em especial das instituições bancárias, fundos de pensão e fundos de investimento, que operam planos de previdência, e os credores de títulos públicos.
Vincula-se às políticas de austeridade já aprovadas em 2016, como o novo regime fiscal, instituído pela Emenda Constitucional 95/2016 que estabelece teto para ampliação das despesas primárias, vinculadas à inflação, pelo prazo de 20 anos e, também, com a ampliação da desvinculação da receita da União (DRU), de 20% para 30% dos recursos destinados ao gasto social, que incidem, sobretudo, no orçamento da seguridade social.
Em janeiro deste ano, o Governo anunciou que o “déficit” da Previdência Social, em 2016, foi de R$ 151,9 bilhões, equivalente a um crescimento de 59,7% em relação a 2015. Relaciona, ainda, à queda de 6,4% da arrecadação, comparada a 2015. No entanto, de acordo com a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (ANFIP), o orçamento da Seguridade Social apresenta sucessivos resultados superavitários. O que acontece é que o Governo leva em consideração somente a arrecadação previdenciária direta urbana e rural, deixando de informar à sociedade, bem como de respeitar, a Constituição de 1988, em seu art. 195, ao estabelecer que a “Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais”: Contribuições Previdenciárias pagas pelos empregados e pelas empresas sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta de vendas; Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das Empresas (CSLL); Contribuição Social Para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), cobrada sobre o faturamento das empresas; Contribuição para o PIS-Pasep para financiar o Programa de Seguro Desemprego e os programas de Desenvolvimento do BNDES, também cobrados sobre o faturamento das empresas; Contribuições sobre Concurso de Prognósticos; Receitas próprias de todos os órgãos e entidades que participam desse orçamento.
Ao não considerar as fontes estabelecidas pela Constituição, o Governo Federal volta-se contra os trabalhadores e contra a já limitada perspectiva de universalidade inscrita na concepção de Seguridade Social brasileira.
Entre as mudanças propostas na PEC 287, está a definição da idade mínima de 65 anos e tempo mínimo de contribuição, de 25 anos, para homens e mulheres, tanto do Regime Geral, quanto dos Regimes Próprios da Previdência Social, passando a ser aplicada aos trabalhadores com idade inferior a 50 anos, e trabalhadoras com idade inferior a 45 anos.
Os/as demais trabalhadores/as com idade superior farão parte de uma regra de transição que leva em consideração o pedágio de 50% de contribuição que falta para 35 anos (homem) ou 30 anos (mulher), ressaltando-se que para os professores da educação básica e rurais, o pedágio é de 50% sobre o que falta para 30 ou 25 anos de contribuição.
Rompe-se com o tempo de contribuição mínima de 180 meses, equivalente a 15 anos, e passa-se à exigência de 300 contribuições, equivalente a 25 anos. Se aprovadas, tais medidas dificultarão ainda mais a possibilidade de aposentadorias com valor integral, tendo em vista a exigência de mais tempo de emprego formal registrado.
Soma-se às alterações destacadas, a base de cálculo para a aposentadoria, que passa da média de 80% dos maiores valores de contribuição, para a média de todos os valores de contribuição.
O valor da aposentadoria será 51% da média dos salários de contribuição, acrescido de 1% por cada ano de contribuição. Para se alcançar o valor de 100% da média das contribuições, será preciso 49 anos.
Dificilmente algum trabalhador conseguirá aposentar-se aos 65 anos, com valores médios integrais, seja pela incapacidade contributiva e baixa estimativa de longevidade, seja devido aos elevados índices de desemprego e rotatividade no emprego. Pois, seria necessário contribuir ininterruptamente desde os 16 anos de idade.
É de fundamental importância ressaltar que, além das alterações de idade, tempo de contribuição, outros itens da PEC, esta se caracteriza pelo caráter restritivo, tais como a redução do valor da pensão por morte para 50%; da extinção da aposentadoria especial de professores do ensino fundamental e de profissionais da área de risco; da mudança da contribuição do trabalhador rural (segurado especial) de 2,1% sobre a comercialização de seus produtos, valendo para o grupo familiar, para uma alíquota individual sobre o salário mínimo; da proibição de criar novos Regimes Próprios de Previdência Social – RPPS para servidores públicos dos estados e municípios e a determinação para os que permanecerem com estes regimes fixarem o teto do RGPS para as aposentadorias e criarem a previdência complementar; da elevação da idade de 65 para 70 anos para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) pelas pessoas idosas e da desvinculação do seu valor do valor do salário mínimo.
A equiparação das regras para homens e mulheres, e entre as distintas regiões do País, acentuará as desigualdades sociais já existentes.
Se considerarmos os indicadores de longevidade disponibilizados pelo IBGE, segundo o qual, para os homens nordestinos ao nascer, a média é de 70,2 anos, sendo que a estimativa para Alagoas, Maranhão e Piauí é 66 anos. Para trabalhadores dessa região, será negado o direito à aposentadoria ou ao BPC porque não alcançarão a idade mínima.
Ainda que os indicadores (IBGE) relativos à estimativa da expectativa de vida ao nascer para as mulheres, em 2015, de 79,1%, tenham sido superiores às estimativas para os homens, é necessário considerar as condições a que estão submetidas, bem como a tendência de crescimento na indicação da mulher como pessoa de referência na família.
No âmbito do trabalho, a PNAD (4º trimestre 2016) indica que, apesar das mulheres serem a maioria na população em idade de trabalhar, verifica-se a predominância da ocupação de homens, estimada em 64,3%, enquanto o das mulheres fica em 44,5%.
Como afirma o IBGE, em 2015, as mulheres recebiam em média 76% do rendimento dos homens, mas quando se relaciona ao rendimento ao tipo de inserção, esse percentual ainda se reduz, sendo que as mulheres em trabalho informal recebiam 49,0% do rendimento das mulheres em trabalho formal.
Ressalta-se a desigualdade entre homens e mulheres, também, quanto às distintas jornadas de trabalho, bem como à ocupação de cargos de chefia ou direção, sendo que a mulher além de ocupar em menor proporção cargos dessa natureza, é elevada a desigualdade salarial.
A desigualdade nas atividades relacionadas com os afazeres domésticos e cuidados impactam principalmente para as mulheres considerando, segundo a PNAD, que a jornada feminina em tais atividades é duas vezes maior do que a masculina e, quando se soma à jornada das mulheres no mercado de trabalho, o total de sua jornada ultrapassa em média em 5 horas semanais, a jornada masculina.
A proposta em andamento rompe com o princípio de equidade na participação do custeio, que garante, atualmente, a cobertura a mais de 6,5 milhões de segurados especiais, e em relação às desigualdades de gênero, que garante regras afirmativas para as mulheres.
Pelas diversas situações ressaltadas, nos somamos à luta em defesa dos direitos e da seguridade social. Não à PEC 287!
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